Os rendimentos das famílias em 2021

A primeira preocupação de uma entidade financeira que se pretende sustentável está naturalmente no acompanhamento da situação financeira dos seus clientes, sejam empresas ou particulares.

No debate do Orçamento de Estado para 2021 é apresentada uma redução da taxa de retenção na fonte em sede IRS, que de facto terá um impacto nesse ano num crescimento dos rendimentos disponíveis das famílias. Mas que terá o reverso no ano de 2022, quando do apuramento do saldo entre IRS retido e o efetivamente devido, tendo esta medida, e no conjunto dos 2 anos, um efeito nulo.

A questão dos rendimentos disponíveis e a sua aplicação, em consumo ou em investimento, podendo este ser visto como uma forma de consumo diferida no tempo, são essenciais para o crescimento económico de um País.

Daí a importância de medidas públicas tomadas neste domínio, não obstante, nalguns casos, o caráter perverso do seu objetivo, não se apoiando quem mais necessita. Por exemplo, no atual sistema das moratórias de crédito decorrentes da pandemia que vivemos, ficam desde logo excluídas as famílias que já tinha moras em prestações devidas à Banca, sendo certamente quem mais precisaria deste apoio.

Em termos de crescimento económico, já um economista brilhante do século passado, John Kenneth Galbraith, a propósito da Grande Depressão de 1929, pôs a desigualdade na distribuição de rendimentos como estando na génese da crise.

O problema estava em existirem poucos consumidores a alimentar o sistema, o que tornou a economia dependente de um alto nível de investimento ou de um elevado consumo de bens de luxo. Tentou-se resolver o problema através do crédito, assim aumentando a capacidade financeira e o poder de compra das famílias. Contudo, a solução passa de facto por aumentar o consumo e o investimento, mas pela via do acréscimo de rendimento dos agentes económicos, não do seu endividamento.

Galbraith conclui que a solução sustentável passa necessariamente pela correção real das desigualdades na distribuição de rendimento.

Numa economia, pelo poder que a circulação de dinheiro tem em termos da sua multiplicação, mais vale distribuir poucos rendimentos a muitas pessoas, do que em seguir a política contrária, como geralmente é feita, em termos de grandes obras públicas ou capitalizações públicas excessivas de algumas empresas.

No quotidiano d’ A Caixa Económica do Porto – CEP –, uma instituição de crédito supervisionada pelo Banco de Portugal e propriedade a 100% da Associação Beneficência Familiar, está o procurar respostas para as necessidades dos seus associados.

A CEP, como instituição da economia social, pretende associar, sempre que possível, um objetivo desse cariz ao mero financeiro de ter lucro.

Conforme já referido no anterior artigo, a ajuda na reabilitação de habitações de pessoas com menores rendimentos é um desses objetivos estratégicos assumidos pela CEP.

Deixamos as seguintes questões para reflexão:

“Numa manhã de novembro, na rua, um cruzar com a situação de uma senhora idosa, muito modestamente vestida e acompanhada de um saco de plástico de poucas compras, a empurrar um enferrujado portão e caminhando pelo abandonado jardim até abrir a porta de entrada, antecâmara de uma escura habitação, com estores muito limpos, mas partidos.

Qual o valor daquela habitação, muito bem localizada, mas num degradado estado de preservação, pelo abandono do espaço e da pessoa?

Teria esta senhora família e herdeiros?

Deve e pode o valor atual de uma vida ser transferido para uma futura valorização do imóvel, a usufruir por terceiros?

Como se pode ajudar na recuperação destas habitações, detidas por proprietários idosos e de muito baixos rendimentos?

Conjuntamente, será também possível melhorar as atuais condições de vida de alguns idosos nestas situações de baixos rendimentos, aumentando-os?”

Será a capacidade de construir respostas para estas situações que definitivamente contribuirá para o crescimento económico e, sobretudo, para a melhoria das condições de vida de quem nos rodeia.

José Ferraz Alves
Diretor
Caixa Económica do Porto – anexa à A Beneficência Familiar – Associação de Socorros Mútuos